Os usuários contam com um meio de transporte para ir para casa quando os trens deixam de circular
Toda vez que Shigeki Kobayashi se depara com um trabalhador pedalando e levando a sua sacola na cesta da frente da bicicleta, ele sabe que está vendo um novato que acabou de entrar para o grupo daqueles indivíduos que vão trabalhar de bicicleta. Essa conclusão deve-se ao fato de a carga pesada na frente fazer com que fique mais difícil manobrar o guidão, o que é um erro elementar.
Kobayashi também percebe que uma pessoa está começando agora a praticar o ciclismo de rua quando o ciclista pedala na calçada. “Algumas pessoas acham erradamente que é mais seguro pedalar na calçada”, diz ele. “Isso é um erro, já que na calçada existe uma probabilidade maior de o ciclista chocar-se contra algo ou alguém”.
Kobayashi é diretor do Grupo de Estudos para a Promoção do Uso da Bicicleta, uma organização sem fins lucrativos que promove o uso de bicicletas em Tóquio. Desde 11 de março, quando um terremoto seguido de tsunami devastou o norte do Japão, as ruas de Suginami, onde ele mora, estão repletas de ciclistas que pedalam rumo ao trabalho. “O aumento foi súbito e visível”, disse ele durante uma entrevista.
No decorrer dos últimos 20 anos, mais trabalhadores em áreas urbanas como Tóquio têm passado a usar a bicicleta como meio de transporte para o trabalho, em vez de trens e carros, devido a preocupações com a saúde, o meio ambiente, custos e por desejarem evitar os trens superlotados. A catástrofe ocorrida no mês passado converteu agora alguns dos indivíduos que ainda estavam indecisos, ao comprovar mais um dos benefícios do ciclismo: o usuário conta com um meio de transporte para ir para casa quando os trens deixam de circular.
Naquele dia fatídico, milhões de trabalhadores viram-se presos no meio da cidade quando praticamente todo o sistema de trens e de metrô de Tóquio – que juntos transportam nove milhões de pessoas diariamente para a megalópole e de volta para casa – ficou inteiramente paralisado. As ferrovias interromperam a circulação de todos os trens por temerem os terremotos secundários que se seguem ao principal. Embora a maioria dos trens de superfície e de metrô tivessem voltado a funcionar por volta de meia-noite, centenas de milhares de pessoas tiveram que caminhar para casa ou dormir nos seus escritórios ou em prédios públicos.
Em meio a colegas preocupados que não sabiam como voltar para casa, Masataka Isashiki, 32, um funcionário público do bairro de Chiyoda, no centro da cidade, surpreendeu os amigos ao dizer que iria para casa como sempre foi: ele colocou o seu capacete e subiu na sua bicicleta. “A rua estava totalmente congestionada, mas eu simplesmente passei pelos carros que estavam presos no trânsito”, conta ele. “Os meus colegas ficaram impressionados”.
Naquela noite, multidões trabalhadores que seguiam para casa a pé, em uma jornada de até 20 quilômetros, literalmente invadiram qualquer loja de produtos ciclísticos que encontraram no caminho para comprarem uma bicicleta.
“Uma quantidade enorme de gente comprou bicicletas no caminho de casa”, diz Kenji Tanaka, secretário geral da associação de vendedores de bicicletas de Tóquio. “Naquela noite, muitas lojas venderam todo o estoque e ficaram vazias”.
“Desde então, as vendas têm aumentado constantemente e as encomendas não param”, acrescenta Tanaka.
“Como reflexo disso, há hoje em dia mais pessoas de bicicleta na estrada de manhã do que havia um mês atrás”, diz Isashiki. “Eu também vejo mais bicicletas estacionadas em frente ao prédio em que trabalho”.
Kobayashi, diretor do grupo de defesa dos ciclistas, conta regularmente o número de ciclistas que passam por uma movimentada avenida que leva ao centro de Tóquio. Em um certo dia em novembro passado, ele contou 105 bicicletas entre às 7h e às 8h. Esse número aumentou para 243 em 14 de março, três dias após o terremoto, e para 330 em 30 de março.
“O terremoto fez claramente com que aumentasse o número de pessoas que vão trabalhar de bicicleta”, diz ele. “Isso faz lembrar o súbito aumento do número de ciclistas em Londres após os atentados a bomba de 2005, quando o transporte público foi suspenso durante algum tempo”.
As pessoas que tentam seguir de bicicleta para o trabalho logo descobrem que a tarefa de encontrar o caminho pelas ruas sinuosas de Tóquio é longe de ser difícil ou exaustiva. “Com smartphones e o Google Map, a tarefa fica fácil”, diz Kobayashi. “Elas também percebem que a experiência de pedalar é bastante agradável. De forma geral, o terremoto provocou em muitos uma mudança de estilo de vida”.
Isashiki, o funcionário público, pedala dez quilômetros por dia – uma viagem de 40 minutos – na sua bicicleta prateada Bianchi, um modelo italiano pelo qual ele pagou 80 mil ienes, ou US$ 960. “De maneira geral, andar de bicicleta é muito mais agradável do que seguir imprensado dentro de um trem lotado”, diz ele.
Pedalar reduz o estresse, diz Takayuki Maruyama, 51, um executivo de uma companhia de tecnologia da informação localizada no centro de Tóquio, que pedala para o trabalho uma ou duas vezes por semana. “Algumas pessoa dizem que a gente pode ficar exausto ao andar de bicicleta”, diz ele. “Mas eu me sinto revitalizado. O único problema é estacionar. Não existe um estacionamento exclusivo para bicicletas, de forma que eu a deixo na calçada”.
Para a maioria dos ciclistas metropolitanos, os benefícios mentais e cardiovasculares do ciclismo superam as vantagens ambientais, já que a maior parte deles anteriormente andava de trens, e não de carros.
“Desde mais ou menos 2002, as pessoas falam da síndrome metabólica e outras coisas do gênero que afetam as pessoas de meia idade, o que deu início ao boom inicial do ciclismo”, explica Kobayashi.
Segundo o Instituto de Promoção de Bicicletas do Japão, uma agência governamental, o número de proprietários de bicicletas em Tóquio subiu de 7,07 milhões em 1990 para 8,99 milhões em 2008, o último ano para o qual há estatísticas disponíveis.
Recentemente, houve também explosão da demanda pelas bicicletas elétricas, especialmente após o terremoto de março.
Tooru Miyake, gerente da equipe de planejamento de vendas da Panasonic Cycle Technology, com sede em Osaka, diz que, provavelmente como resultado do terremoto, a venda de bicicletas elétricas da companhia cresceu cerca de 30% em março em relação ao mesmo mês do ano passado. Em fevereiro, esse aumento foi de apenas 10%.
A companhia não revela quantas bicicletas vendeu, mas diz que o total de vendas de bicicletas elétricas no Japão é de cerca de 380 mil por ano, e que a Panasonic detém 40% desse mercado.
Com informações de uol.com.br
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